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Chorão: Marginal Alado, as cicatrizes de uma história mal escrita e as circunstâncias que a tornaram um beco sem saída.

Nathiele Saraiva
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 Marginal: do latim marginales, significa relativo à margem.


Ser marginalizado significa estar separado do resto da sociedade, forçado a ocupar as beiras ou as margens e a não estar no centro das coisas. Pessoas marginalizadas não são consideradas parte da sociedade.

 

Alado: do latim alatus, significa dotado de assas, que voa.


“Meus heróis também morreram de overdose”, cantava Cazuza no final dos anos 80. E de fato, muitos dos nossos grandes heróis, morreram de overdose ao longo da história. Aqui no brasil, por exemplo, a geração que nasceu nos anos 90 e cresceu durante os anos 2000, presenciou a vida e história de um cara que fez jus a frase de Cazuza.


Nosso herói morreu de overdose em março de 2013 e eu lembro direitinho a sensação que tive quando soube disso. Ouvir Charlie Brown Junior, pra quem não tem mais o costume, é um misto de emoções. É como ouvir pela primeira vez e se encantar com cada palavra e com a maneira como essas palavras são ditas: com muito amor, carinho e uma fé inabalável.

Ouvir Chorão cantar é como ouvir a voz de um velho amigo, aquele amigo que tu encontra uma vez ou outra na correria do dia a dia e senta pra tomar um gelo e conversar sobre a vida. Que tem aquelas conversas que te renovam e somente pessoas que te conhecem e conhecem a tua caminhada conseguem desenvolver. Pessoas que tem os mesmos ideais de vida, que querem te ver bem, evoluindo, que se importam, que acreditam e sempre são capazes de renovar a tua fé.


Fé e liberdade, acho que foram as palavras mais ditas por ele nas músicas dos Charlie Brown. O cara tinha uma fé inabalável e uma sede de liberdade indescritível e com a sua arte, salvou milhares de vidas. Mas porque então não conseguiu salvar a própria?

O filme Marginal Alado de 2019, lançado em 2021, escrito e dirigido por Felipe Novaes, retrata a vida e carreira do líder do Charlie Brown Jr, e mais do que isso, honra seu legado e objetiva confortar os fãs que até hoje se carregam essa dúvida.

Entre depoimentos de artistas, familiares e amigos em contraponto com trechos de shows, falas de fãs e palavras do próprio Chorão, o filme amplia nossa visão para além da obra do Charlie Brown Jr e nos apresenta uma pessoa vulnerável, intensa (no bom e no mal sentido da palavra) e que buscava um determinado equilíbrio para conseguir viver com tanta coisa a boa e ruim dentro de si pegando tudo o que tinha de bom e transformar em algo maior do que ele mesmo.

Em uma das cenas mais emocionantes do filme, vemos uma conversa de Chorão com uma fã chamada Carol, onde ele diz o seguinte:

“Tudo que você busca em mim, que você possa buscar em mim, tá dentro de você. Tá no teu coração, na tua cabeça. Eu sou só um reflexo das coisas que você acredita e as vezes, eu digo uma coisa que vem de fora e a gente precisa escutar de fora pra poder acreditar, mas tá tudo dentro do teu coração. […] eu só tô na parada porque eu sei que tem uma galera especial que gosta de mim. […] Baixa o som, não gasta dinheiro com essa porra. baixa o som, tá ligado? O som é pra vocês, não precisa comprar.

Ama as pessoas e usa as coisas, o máximo que tu puder!”



Chorão era grande, isso é fato. E às vezes, pessoas grandes não cabem, não controlam, não encaixam, explodem. Essa fala pra fã, resume bem a mensagem que ele queria passar para as pessoas. Não é só sobre ele, é sobre nós. Quem nós somos, no que acreditamos, no que queremos ser. O que da parte dele nos toca também está dentro de nós e é por isso que faz sentido.

As músicas do Charlie Brown fizeram parte da história de milhares de brasileiros e por ser uma figura radical, malandro, ligado a cultura, ao skate, ao rock e que detinha um senso de justiça inigualável, contribuiu para a formação de cidadãos críticos, artistas e pensadores se tornando o maior porta voz de sua geração. Uma geração que estava, mesmo sem consciência, a margem da sociedade, que tinha sonhos, que não se contentava com pouco e nem com o sistema.

“O fato de eu ter tatuado em mim, no meu braço marginal não quer dizer eu sou um marginal que faz várias fitas que assalta os outros não. Quer dizer que eu estou à margem de muita coisa que eu acho que é hipócrita que é mentirosa, eu tô na margem da inveja, eu tô na margem da revolta ruim, porque eu fiz da minha vida de trabalho de batalha e nela o meu sonho se fez e se fundiu graças a vocês, mas a gente batalhou muito para chegar aonde a gente tá."


Sabendo de seus defeitos, de seus demônios e de suas batalhas, ele optou por transformar seus sentimentos em mensagens de amor, fé e esperança, para que os fãs se identificassem com o que ele tinha de melhor porque essa era a sua própria busca também, ser melhor e, quem sabe, se ele mostrasse esse seu lado para o público, muitos de nós não entenderiam e talvez por não querer dividir isso com seus fãs, família e amigos, fez com que ele se sentisse pior com suas próprias dores.

“Na época em que o chorão morreu, eu tava com muito problema pessoal e me identifiquei muito com ele. Da forma como ele morreu. De uma certa forma, eu me vi junto com ele. Coisa que quando você ficar mais velho, daqui há uns 5 anos cê vai entender. Esse cara morreu sozinho. Eu tava num show com ele e ele fez um movimento com a mão e a massa foi toda com ele e quando ele olhou pra mim, com a cara mais triste do mundo, como se ele não tivesse feito nada. Caralho, o Chorão não é um cara feliz… dores da alma, dores do mundo…” Mano Brown falando sobre Chorão.

Marginal Alado nos faz o relembrar o legado de Chorão como artista, sobre quem ele foi, quem ele queria ser e quem ele realmente era. Mas também nos fazer entender o sentido de tudo isso, o que ele queria que fossemos, como pode contribuir pra isso e mostrar que ele realmente contribuiu, muito! E sempre poderá retribuir toda a vez que precisarmos daquele nosso bom e velho amigo Chorão, ele estará lá, em sua vasta obra, e saberá exatamente o que e como nos dizer, esse é o seu grande legado, como quando disse pra Carol:

Ame as pessoas e use as coisas, o máximo que tu puder!

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