Erykah Badu, a voz aveludada que revolucionou o R&B e o soul, tem uma história tão rica quanto sua música. Nascida em Dallas, Texas, em 1971, a cantora desde cedo demonstrou um talento nato para a arte. Aos quatro anos, já atuava ao lado da mãe e, aos sete, compunha suas primeiras canções.
Influenciada pelo Hip Hop e R&B dos anos 60 e 70, Erykah trilhou um caminho repleto de criatividade e inovação. Após cursar teatro, a artista adotou o nome artístico Erykah Badu e iniciou sua carreira musical, mesclando o rap e o soul com uma sonoridade ímpar.
A carreira de Badu tem um divisor de águas com o álbum Baduizm. Lançado em 1997, esse trabalho seminal do neo-soul não apenas marcou a carreira da cantora, como também moldou todo um movimento musical. O impacto do disco foi imediato, debutando no topo das paradas de R&B e Hip Hop, vendendo milhões de cópias e rendendo à Erykah Badu dois Grammys. Mas além dos números, o trabalhou deixou uma marca inegualável no coração dos fãs, sendo aclamado pela crítica e pelo público.
Mas afinal, o que torna esse disco tão especial? Vamos mergulhar nessa obra-prima, faixa a faixa, e desvendar os segredos por trás de sua longevidade. Gravado entre janeiro e outubro de 1996 no Battery Studios, em New York, no Dallas Sound Lab, no Texas, e no Sigma Sounds & Ivory Studios, na Pennsylvania, o disco tem 58:15 e foi lançado pela Kedar/Universal e seu time de produtores contou com Jaífar Barron, Robert Bradford, Madukwu Chinwah, JaBorn Jamal, Ike Lee III, Richard Nichols, James Poyser, Bob Powers, The Roots, Tone the Backbone, além da própria Erykah Badu.
O disco abre com a intro "Rimshot", termo que é dado à técnica de tocar bateria que "consiste em tocar determinado tambor de maneira que a baqueta, no momento do ataque, vá de encontro ao aro e o centro da pele do tambor ao mesmo tempo, reproduzindo assim um som mais encorpado e volumoso", conforme a definição da Wikipédia. A sonoridade desse som explosivo se tornou uma faísca criativa. Badu ligou para o produtor e compositor Madukwu Chinwah, perguntou qual era daque som de tik-tak e pediu para que ele cumpusesse um ritmo inteiro baseado no "rim shot".
Seguindo temos o hino instantâneo com "On & On" e seu groove contagiante e letra introspectiva sobre relacionamentos e autoconhecimento ("You rush into destruction 'cause you don't have nothing left"), a faixa se tornou um mantra para a geração neo-soul. Essa faixa saiu no ano anterior como single e marcou a estreia de Erykah Badu. “On & On” beda da influência de Billie Holiday em seu estilo vocal. A música chegou na posição #12 na Billboard Hot 100 e liderou as paradas Hot R&B/Hip-Hop Songs e UK Singles e ganhou a certificação de single de ouro, além de ganhar o Grammy de Melhor Performance Vocal Feminina de R&B em 1998.
Uma informação interessante sobre a faixa é trazida pelo site Genius que explica que "como muitas outras figuras do hip-hop dos anos 90, Erykah explorou os ensinamentos da Nação dos Deuses e das Terras (também conhecida como Nação dos Cinco Por Cento), referenciando a teologia da Matemática Suprema do grupo".
A faixa três é "Appletree", uma ode à individualidade e à expressão artística. A voz de Badu brilha com confiança enquanto ela canta sobre romper moldes e abraçar a singularidade: "I can't control the soul flowing in me. Ooh-wee". Seguindo temos canção com a participação do lendário grupo The Roots em "Otherside of the Game". A faixa mergulha em um território mais complexo e explora o dilema de amar alguém envolvido com atividades ilícitas: "Work ain't honest, but it pays the bills", com arranjos de jazz e a voz comovente de Badu.
Seguindo temo a track "Afro (Freestyle Skit)" que injeta uma dose de humor no álbum. Com influências da old school do Hip Hop, Badu assume o papel de uma mulher forte que recupera um pager de um namorado infiel, mostrando sua personalidade descontraída e irreverente. Já a música de número oito contrasta com o tom da faixa anterior, "Certainly" é uma ode serena ao amor inesperado. A suave progressão de piano e a voz delicada de Badu criam uma atmosfera romântica, celebrando o sentimento de ser surpreendido pelo amor: "Who gave you permission to rearrange me?".
Erykah Badu faz uma homenagem à banda Atlantic Starr, da cidade de White Plains. O grupo iniciou suas atividades em Greenburgh, New York, no ano de 1976 com o trompetista Duke Jones, porém esse deixou a banda antes de ela gravar suas primeiras músicas. Badu faz um remake de "Touch a Four Leaf Clover", lançado pelo Atlantic Starr no álbum Yours Forever de 1993 pela A&M. Com essa referência, Erykah faz "4 Leaf Clover" e o que difere da versão original é sua inconfundível marca com vocais alegres e instrumental vibrante injetando energia positiva no álbum.
"No Love" é um retrato cru de relacionamentos disfuncionais. A letra crítica parceiros infiéis e a superficialidade: "Too much drama, ain't got no heart", com o rap melancólico de Badu dando voz à frustração e à desilusão amorosa. O tema tem continuidade na faixa de número onze. "Drama" tem uma atmosfera mais densa e introspectiva. A voz de Badu se torna mais grave e a instrumentação minimalista reforça a carga emocional da letra e expande a temática do relacionamento tóxico, com: "Why create drama when there ain't none?".
Partindo para o final do disco, a música "Sometimes…" retoma o interlúdio do começo do álbum. Na versão completa do interlúdio, a música oferece um momento de contemplação instrumental com piano e elementos de jazz. A penúltima faixa é "Certainly (Flipped It)" é uma releitura de "Certainly", apresentando a música de uma perspectiva diferente. A faixa explora a vulnerabilidade e a insegurança que acompanham o amor novo, com um tom mais hesitante e introspectivo.
Por fim, o disco se encerra como começou, com "Rimshot (Outro)". A faixa final funciona como um espelho da faixa de abertura, completando um ciclo musical e conceitual. Ao retornar ao som do "rim shot" que inspirou todo o álbum, Erykah Badu nos convida a refletir sobre a jornada sonora que acabamos de percorrer. O encerramento é poético e a repetição do "rim shot" cria uma atmosfera hipnotizante e meditativa, convidando o ouvinte a se conectar com as emoções e reflexões despertadas pelas faixas anteriores. É como um mantra, um ponto final que, ao mesmo tempo, abre portas para novas interpretações.
Esse convite para uma jornada instrospectiva que as canções de Baduizm fazem é o que torna o álbum um marco do neo-soul. O movimento de resgate das raízes do soul e do jazz, infundindo-as com elementos contemporâneos como o rap e as letras introspectivas e poéticas, arranjos sofisticados e melodias envolventes, fizeram com que mais de duas décadas e meia depois, a obra continua a encantar e a influenciar novas gerações de artistas.
Não é exagero dizer que o disco Baduizm não apenas conquistou o público, mas também redefiniu os contornos do R&B e do soul e se tornou um dos principais pilares desse gênero. A música de Erykah Badu transcende gerações e gêneros, conectando pessoas de diferentes origens e culturas. O álbum é uma prova de que a boa música não envelhece e que a alma de Erykah Badu continua vibrando forte. Baduizm, de fato, é um banho de neo-soul que nunca sai de moda.
Por que Baduizm continua relevante hoje?
A resposta é simples: a música de Erykah Badu é atemporal. Suas letras falam sobre temas universais que nos conectam como seres humanos, e sua música é um reflexo da alma negra, rica e complexa. Ao ouvir "Baduizm", sentimos uma conexão profunda com a artista e com nós mesmos.
Se você ainda não conhece Baduizm, corra para ouvi-lo! Prepare-se para se apaixonar por uma das vozes mais poderosas e originais da música contemporânea.
E aí, curtiu essa resenha? Compartilhe suas impressões sobre o álbum nos comentários!
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