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VAI PRA CUBA | As Aventuras de Thaide Pela Ilha Socialista

Jeff Ferreira
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Após a dupla Thaide e DJ Hum lançar o álbum Preste Atenção, em 1996, a boa repercussão rendeu um convite para migrarem de gravadora, da Eldorado para a Trama. A mudança se deu através de uma pessoa chave: Wagner Garcia, que havia trabalhado na Eldorado e cuidado pessoalmente dos artistas e a gora estava na Trama. O primeiro trabalho na casa nova, curiosamente, seria o último da dupla, o disco Assim Caminha a Humanidade, de 2000.


Antes disso, Thaide e DJ Hum vão à França para participarem do MIDEN, um festival internacional de música que existe desde os anos 1960. Sobre essa viagem, Thaide relata em seu livro Pergunte a Quem Conhece: Thaide, escrito por César Alves (Labortexto, 2004):


Esta viagem à França foi muito bacana e nos marcou bastante. Eu agradeço a oportunidade de conhecer este país e pretendo um dia voltar para Paris. A França é um lugar lindo e a viagem foi muito proveitosa [...] Na França não tinha tanta mulher bonita quanto em Cuba. A garota mais bonita que nós vimos em Paris foi a recepcionista negra do hotel onde nos hospedamos. Acho que na França é tudo muito certinho. Nós fomos bem tratados, mas eles não são maloqueiros como nós. Já os cubanos são, e muito”.


Thaide fala de Cuba pois outro país que teve a oportunidade de conhecer através de seu trabalho musical com o rap. Em 2000, a cineasta Kátia Lund - que codirigiu o premiado Cidade de Deus, ao lado de Fernando Meireles - tinha um projeto para rodar alguns documentários sobre o Hip Hop, queria registrar a cena no Brasil, EUA e Cuba. E para a ilha caribenha convidou Thaide para acompanhá-la, o MC rapidamente aceitou e partiram para o país socialista.


“Em Cuba rola um rap de primeira e grupos são de muita qualidade. Infelizmente, aqui a gente nunca ouve falar deles. [...] Eles gostam de festas, de música, de dança. Acho que foi justamente pela proximidade com o povo brasileiro que gostei mais da ilha do Fidel”.


Thaide se relacionou com os artistas da cena local, conheceu o bairro de Alamar, local onde nasceu o rap cubano (leia mais sobre o Hip Hop em Cuba aqui). E sobre esses encontros, o rapper revela:


“Lá conheci muita gente bacana e dou nota mil para o pessoal de Cuba. Conheci o Coquino, que participa de uma dupla que se chama Hermanos de Causa. Fiz amizade com o René, que tem um trabalho solo que é muito bom, e sempre cola aqui no Brasil, porque a namorada dele é brasileira. O Pablo Records é um personagem engraçado de Cuba, porque ele é médico e faz um rap da pesada, coisa que não se vê aqui pelo Brasil. Lá também eu conheci um produtor chamado Paco Hejera, muito bom”.


O Sr Tempo Bom não somente passeou por Cuba, mas também fez rap na ilha e fez shows por lá:


“Eu fui a um evento ao ar livre que rolou e percebi que a maioria das pessoas é composta de negros, e é claro que eu me senti em casa. É igual ao Brasil. Cheguei a me apresentar em Cuba e fiz música lá, mas pretendo voltar para me apresentar no festival nacional de rap cubano, que rola todo ano. A cultura deles é muito louca”.


Thaide também conta sobre o cuidado do povo cubano e relação com a polícia local:


“Eles gostam muito de brasileiros e chega até a ser chato o cuidado que eles têm com a gente.  Pros cubanos as autoridades ficam o tempo todo pedindo documentos e tal. Quando você está conversando com um cubano na rua, eles já vêm perguntar se está tudo bem. É um lugar onde não rola crime, um país maravilhoso, cheio de mulheres bonitas, todo mundo se veste bem. A música é muito boa”.


Outro ponto que chamou bastante a atenção do rapper foi em relação a religião. Os cubanos praticam a santería, uma religião de matriz africana:


“O sincretismo religioso é bem parecido com o brasileiro. Conversei com uma mãe-de-santo de lá sobre as proximidades entre o candomblé e a santería, que é o nome que a região tem lá. Falei dos nomes de alguns orixás brasileiros e ela me mostrou os equivalentes deles”.


Durante sua estadia, Thaide ia até o calçadão da praia, o famoso Malecón, onde tomava Mojitos, um coquetel à base de rum branco tipicamente cubano. Também foi para o baile La Pampa, em frente ao Malecón. As andanças pelas calles de Havana mostraram um lado verdadeiro de Cuba, bem diferente do que os noticiários brasileiros falam sobre a ilha. Thaide relata o que viu pelo país:


“Em Cuba percebi que 80% dos lugares são de periferias. Vi muitos carros antigos nas ruas, muitas construções condenadas, mas muito pobre morando em palacetas, graças à revolução. São muito patriotas. Todo mundo lá é partidário da revolução e quase todo mundo apoia o Fidel. E por causa do embargo econômico, não se vê esse monte de propagandas como a gente tem por aqui”.


Os elogios à Revolução Cubana não terminam por aí. O MC lembra que não se via por Havana, cidade grande e populosa, o que se via em outras cidades: o marketing agressivo e ofensivo do capitalismo. A propagando era em prol da revolução e para lembrar os mais jovens, e turistas, sobre o passado de lutas que culminaram nos excelentes índices de educação e saúde – só para citar alguns – na ilha.


“Só se vê propaganda política, palavras de ordem, incentivo político, tipo: ‘Ame seu país como a sua vida’, ‘Valorize a sua pátria’. Essas propagandas sempre têm uma foto de algum militar considerado herói, gente que morreu nos primeiros dias de batalhas pela revolução. Lá comecei a entender por que o Che Guevara é considerado um grande herói cubano mesmo sem ter nascido em Cuba - ele era argentino. É que o Che não queria saber da nacionalidade do povo que ele estava ajudando. Ele lutava porque queria ajudar as pessoas”.


Por fim, Thaide traça um paralelo entre o Hip Hop, cultura que salva vidas e tem como característica ser acolhedora, principalmente as minorias, com o revolucionário cubano:


“Era essa a intenção dele [Che Guevara] e para isso ele não se importava com a raça, a cor ou a língua que as pessoas falavam. Realmente ele é um grande herói. Como o Che, o Hip Hop não se importa com a nacionalidade de ninguém. Atinge qualquer povo, vai a todos os lugares para difundir ideias e conquistar corações e mentes. No Hip Hop somos todos uma grande nação. Acho que era o que pensava Che Guevara quando lutava por um povo que não era do sangue dele”.


O Brasil pouco se propõe a estudar o Hip Hop latino-americano, porém nossos vizinhos possuem obras fantásticas que merecem ser conhecidas. A visão de Thaide sobre Cuba nos ajuda a entender um pouco melhor a ilha socialista e suas particularidades. Bem verdade que a ilha possui diversos problemas – como qualquer país do globo – e muitos deles são provocados pelo embargo econômico promovido pelos Estados Unidos. Apesar disso, o Hip Hop rompeu as diferenças entre essas nações, Cuba capta através das antenas de rádio a música que vinha de Miami e começa a fazer seu próprio rap, mesclando com sua música local: a salsa, guancaco, rumba, jazz cubano e outros ritmos afros carregados do discurso contundente do rap. Por sua vez, Thaide também carrega isso em sua música, essa verve inquieta e que mistura muita brasilidade ao seu rap, um verdadeiro afro-brasileiro!

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