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Página Negra | Entrevista com Malungo, afro-argenttino idealizador de revista afro

Jeff Ferreira
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O Submundo do Som trás um bate papo com Roberto Sena, mais conhecido como Malungo, um afro-argentino e engajado em movimentos negros pelo país vizinho, amante da cultura black, dos livros, do reggae e Hip Hop, Malungo é proprietário da livraria Malungo Libros, em Buenos Aires e aproveitando sua experiência como criador de fanzines, agora edita a revista Página Negra, um veículo pautado na cultura negra, falando de literatura, cinema, moda e música. Nessa entrevista, Malungo fala sobre sua vivência e o projeto Página Negra, confira:

 

Submundo do Som - Em primeiro lugar, muito obrigado pela disponibilidade para bater esse papo. Por favor, se apresente para nós, quem é Roberto Ruiz Sena?

Malungo - Roberto é um sangue bom, um menino de 47 anos, mas que devido suas experientecias tem 97 anos por!!! Militante, jornalista na raça, que não precisa de diploma pra provar nada, formado na universidade das ruas, cartunista. E como dizem eu sou uma máquina de criação de movimentos. Um lutador pelos direitos das minorias, amante da música e da cultura negra. Amante também do rádio e da imprensa escrita. Criador da Malungo Libros, que é a primeira biblioteca móvel com a temática afro da história da Argentina, criada em uma favela de Buenos Aires. Até os quase 40 anos, pude sair com esforço periferia para continuar lutando pela minha; Fui e sou um grande divulgador da cena reggae, fui empresário de algumas bandas nos anos 90, fiz muitos programas de rádio e editei vários fanzines.

Em 2012 decidi criar o Malungo Libros, daí em diante nunca mais fui Roberto, virei Malungo. Só meus amigos íntimos ou as pessoas que me conheceram antes de abril de 2012 me chamam de Roberto.

 

Submundo do Som - Ficamos muito felizes em receber a notícia do lançamento do primeiro número da revista Página Negra. Fale um pouco sobre a linha editorial desse projeto.

Malungo: Página Negra teve sua primeira edição lançada em dezembro de 2020. Acho que junto com a legalização do aborto na Argentina, foram os dois únicos acontecimentos positivos de 2020. Em termos da linha editorial, tem que ver que estávamos cansados ​​de mendigar por vagas por vários meios, por isso decidimos criar um, difundir tudo o que têm para mostrar aos nossos irmãxs, em todos os ramos da arte possíveis, obviamente partindo de um olhar afro, principalmente para difundir... dar a conhecer que dentro da nossa comunidade também temos muitxs irmãxs que são maravilhosxs no que fazem.

 

Submundo do Som - Irmão, como surgiu a ideia de editar a revista Página Negra?

Malungo: Desde adolescente que participo de diversas publicações que me convidam, também sempre fui o criador de vários fanzines, tanto de reggae ou com um toque social, depois saí por um tempo e voltei quando me chamaram para fazer parte da comissão editorial da revista Africania Lá tive muita participação, passei a ser patrocinador e a indicar pessoas para aderirem ao projeto, até que no nº 3 já me sentei à mesa da redação, infelizmente não teve uma quarta edição, queria muito continuar com uma publicação e depois de um ano eu consegui fazer, na verdade a ideia original era fazer um fanzine, mas tudo foi mudando e virou revista, não era a ideia original, saiu do controle e aqui estamos...

 

Página Negra, uma revista afro com alma de fanzine.

Submundo do Som - Como é ser um afro-argentino em Buenos Aires, ao contrário do Brasil, a Argentina não tem maioria negra, como é essa questão no país e, principalmente, como é tratada a questão do racismo?

Malungo: O racismo na Argentina, como em outros países, é estrutural. Chegar a um espaço de poder é uma missão impossível, a Argentina é racista desde a sua fundação, além da melanina, há muitos irmãxs afro aqui, mas como vocês diriam, afro-argentinxs espalhadxs pelo país, existem comunidades que vivem na miséria total, ninguém cuidou delas, como acontece com os povos indígenas, a da pele não faz a questão, aqui você encontra muitxs negros fenotipicamente, com traços afro, nariz achatado, lábios grossos, cabelos crespos... afros. A miscigenação também fez o seu papel, mas aqui há descendentes de escravos, gerações e gerações de afro-descendentes, chamados de tronco colonial, depois há as outras correntes migratórias que passaram sua conta, eles se tornaram afro-argentinxs, seus descendentes são afro-indígenas também, tudo o que o mundo argentino odeia ou quer esconder debaixo do tapete, é o que somos!!!

 

Submundo do Som - Sabemos que o Movimento Negro é atuante na Argentina, como se organizam esses grupos e que ações de conscientização promovem?

Malungo: O movimento negro na Argentina vem crescendo, com suas diferenças obviamente, mas se faz presente, existe uma Rede Federal de Afro-Argentinxs do Tronco Colonial, é a nível nacional, atuam em bloco, então existem vários coletivos afro também, com seus vários espaços e movimentos. Sou de um grupo pequeno chamado Coletivo Antirracista Frota Negra, articulamos e realizamos atividades junto com outros coletivos, acontece também que a Malungo Libros me ocupa muito tempo e me distribuo por vários lados, há muito o que fazer e é isso que estamos fazendo, e se é coletivo Afro ou movimento, e se concordamos com a luta contra o racismo, daí partimos juntos.

 

Submundo do Som - Comente um pouco sobre a data de 8 de novembro, dia dos afro-argentinos, qual a história dessa data?

Malungo: Em 2013 foi conquistado através da luta e de um governo que acompanho, que a lei 26.852 fosse sancionada com o dia 8 de novembro como Dia Nacional da Cultura Afro-Argentina e Afro, no âmbito da promoção e ampliação dos direitos que Desde 2003 o governo nacional vinha se desenvolvendo, o objetivo desta lei é continuar agregando leis que visem a criação de contextos mais inclusivos e a promoção de coletivos e comunidades historicamente esquecidas, já que há mais de 500 anos sofrem racismo, discriminação, invisibilidade, e a comunidade Afro faz parte da identidade argentina e desde 2013 é lei. Foi eleito no dia 8 de novembro em homenagem a nossa Capitã Doña María Remedios del Valle, que lutou no Exército do Norte sob o comando do General Dom Manuel Belgrano, que lhe deu o cargo de Capitã por sua coragem e honra no campo de batalha, ela era, obviamente, uma mulher negra que também soube o que foi perder o marido e os filhos em várias batalhas pela independência.

 

Capitã Doña María Remedios del Valle na capa da revista Página Negra

Submundo do Som - Voltando à revista Página Negra, quem são os colaboradores que ajudam no projeto e contribuem com as colunas da revista?

Malungo: Eu, Malungo, (dirige e coordena), meu braço direito é Bar Mamafrik (desenho, layout e notas), Carol Calcagno (editora), colunistas regulares Omer Freixa (historiadora africanista), Esther Pineda G (socióloga / pesquisadora / escritora), Gladys Flores (educadora popular / feminista afro-guarani), além de convidados de Cartagena, também de colunistas, poetas...

 

Submundo do Som - Qual será a periodicidade das publicações e você planeja também disponibilizar uma versão online para acesso de pessoas fora da Argentina?

Malungo: Propusemos que fosse uma publicação trimestral, no que diz respeito à edição digital, por ser uma empresa autogestiva, somos um pequeno núcleo de pessoas e faltam alguns meios, por enquanto não poderíamos cobrir essa frente, mas espero que sim, pois os países vizinhos estão nos pedindo muito, vamos ver como faremos, Página Negra superou as expectativas, repito: saiu do controle.

 

Submundo do Som - Após o lançamento e repercussão da edição 1, quais são os planos futuros da revista Página Negra?

Malungo: Gostaríamos de ter feito um evento para apresentar a revista, mas devido à Covid-19 isso foi frustrado, os objetivos estão mudando, estamos corrigindo erros à medida que avançamos, o que queremos enfatizar é que não somos uma revista convencional, nosso slogan é: “Uma revista afro com alma de fanzine”, onde prevalecem a música, a história e os livros, acompanhados pelos outros ramos da arte de nossxs irmãxs, o N° 2 está melhor do que o N° 1, com novas colunas e tudo mais.

 

Submundo do Som - Tem alguma coisa que eu não perguntei que você acha que deveria ser dito? Este espaço é seu.

Malungo: Acho que contemplamos tudo, muito grato pelo espaço e, conforme conversamos, espero que você também se torne um colunista fixo da Página Negra, estamos conversando com irmãos do Paraguai, Colômbia, Uruguai, nosso objetivo é formar um bloco preto sólido na América do Sul, se articulando e se comunicando o tempo todo, parece muito ambiciosa, mas não impossível.

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