A música “Oxe não se bote”, é uma canção que retrata a regionalidade identitária de mulheres negras baianas, Amanda Rosa falou sobre sobre como surgiu a música, como foram as parcerias e produção para colocar o som na rua: “Eu e Candace ficamos de fazer uma música juntas, nos encontramos, trocamos várias ideias, sobre música e sobre a vida mesmo, ela foi pra casa, fez uma letra, eu também e nós nos encontramos, aí a parte dela começava com “Oxe não se Bote”, aí reajeitei minha letra, ela reajeitou a dela e nasceu. Nós somos mulheres negras, Candace uma mulher preta retinta de Salvador, eu mulher preta pele clara de Seabra. Nossas letras vão falar disso porque é por onde perpassa nossa vida, não dá pra fugir e inventar um mundo imaginário. Essa música tem o beat de Calibre que é um beatmaker fantástico e com o preço superacessível e um catálogo enorme de beats. E foi gravado no estúdio de Baruan, que pra mim sempre foi um local de trabalho certo, bem feito".
A música “Oxe não se bote” ao sair vencedora de um Festival promovido por uma grande emissora de rádio chama a atenção, pois geralmente os lugares de evidência não são guardados para o rap, ou se há o gênero nesses festivais, possuem arranjos radiofônicos, melodias suaves de violão e teclado que se destacam, ao invés do peso do bumbo e caixa. Neste caso, a Música de Amanda e Candace apresenta uma estética que foge desse padrão, apresentando canto afiado, letra de empoderamento, beat denso e envolvente. A artista reflete sobre esse ponto e e diz: “Acredito que por temos jurados pretos, as vezes por consequência, seremos mais ouvidas. O que temos pra falar, não agrada a branquitude, então vão dar uma série se desculpas pra dizerem que não é bom o suficiente o que fazemos. O rap nunca esteve aqui antes, primeiro porque nunca foi considerado música "de verdade" e com isso, a gente nem se arriscava a festivais. Naná Vasconcelos dizia: "- Eu sou o Brasil que o Brasil não conhece, o que eu toco não faz parte do que acontece na música popular, nem pra pular, mas é brasileiro". Na verdade, não é que não conhecem, é que não querem ouvir. A verdade é que é música de preto e tudo que é de preto nesse Brasil, só é bonito e vendável se branco faz. É só observar o samba, o funk, o rap, jazz, blues, no fim, como diz Letierres, toda música brasileira é afro brasileira. Como tudo que se tem no mundo foi roubado do povo preto, na música não seria diferente. Junto a isso, estamos melhorando nossa autoestima e entendendo que o que fazemos é bom. Se todos MC’s da Bahia resolvessem se inscrever vocês iam ver o bagulho empenar pro outro lado. O que temos aqui na Bahia é fantástico, beats inovadores, letras certeiras, swing, ideia certa, tem pra todos os gostos, o que precisamos é que estejam lá como jurados. Quero alguém do Hip Hop como jurado pra avaliar, rap é música e não precisamos reafirmar isso pra ninguém, chega a ser ridículo fazer esse papel. A partir do momento que a gente conquista algo, temos autoestima pra nos organizar pra profissionalização. É circular a movimentação e não linear”.
O prêmio revigorou a carreira de Amanda Rosa, que também revelou sobre seus planos para o futuro: “Me deu um ânimo na minha cabeça que ainda volta e meia fica a vontade de largar tudo e ir fazer outra coisa. Agora é terminar o processo do EP A Filha Revolta que sairá ano que vem, e ver as formas de rentabilizar o que faço, porque é trabalho e agora tem um rapazinho que depende de mim. Espero que minhas letras continuem sendo importantes para quem ouve, e trazendo os recados que precisam ser dados”. Sobre a premiação em dinheiro, a cantora ainda revela o papel importante de sua produtora para investimento na carreira: “Tô feliz e ansiosa pra conseguir investir essa grana em algo que me dê um retorno dentro da música. Isso é o que Beatriz, que é minha amiga e produtora (que tá assumindo minha produção) pretende fazer comigo, pra eu não fazer falsos investimentos rsrs”.
Amanda Rosa é de Seabra, na Chapada Diamantina, interior da Bahia. É atriz, poeta, MC, cantora, artesã-empreendedora e também produtora cultural, ou como se define: “Sou um misto de o que gosto de fazer e o que preciso fazer. A música me move, e tudo que faço tem ela ao lado. O perfil de Rosa é inquieto, uma mulher que curte das mais diversas experiências musicais: “Ouço de um tudo, de Calypso a Cássia Eller, de Racionais a Olodum. Nos últimos anos tenho conhecido mais a cena local da música e cada vez me apaixonando mais”. A cena do Hip Hop baiano é umas mais efervescentes da cultura em solo brasileiro, Amanda está inserida nesse caldeirão e fala um pouco sobre ele: “Vivencio o movimento Hip Hop em salvador e nele tenho aprendido e trocado muito. O que temos aqui na Bahia, é tudo de inovador que se espalha para o Brasil logo em seguida, sem darem os créditos devidos”. Mesclado a isso, a artista tem raízes nas artes cênicas e comenta: “Minhas influências sempre foram pessoas próximas, que de certa forma eu acompanhava do trabalho, no teatro, Ângela Dantas, Luciana Rocha, Klea Makenda, Diego Araújo foram diretoras de teatro que me apresentaram outra forma de usar a arte. Fabiana Lima, Geilson Andrade, foram poetas que fiquei impactada em escutar, ver o trabalho de Giovani Sobrevivente, Evanilson Alves me dava ânimo na transformação via palavra sem ação”. Já na música, as influências também passam por um liquidificador de estilos: “Ouvir Kainná cantar, é ensinamento de vida. Alcione me despedaça e me dar força, Negra Li me apaixona, enfim, o que me encanta em qualquer ação, é a verdade com que é feita. É isso que tem em comum todas essas referências diferentes em sua essência, porém todas com muita verdade”.
Finalizando, quis saber a opinião de Amanda Rosa sobre o rádio, como veículo de comunicação, em tempos de stremings, a MC não titubeou e respondeu: “A rádio não para nunca e não será substituída tão cedo. O corpo brasileiro é também um corpo africano, a música nos move, e não tá separada de nada na vida. Desde o útero da mãe já se tem música, os órgãos se mexendo é música. É um acesso a todos, em todo lugares. Quando vieram as TVs acharam que ia acabar com a rádio, já tamo em época de 4D e a rádio tá aí, vivona”.
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