Durante a ditadura militar brasileira, que perdurou de 1964 a 1985, o período mais intenso foi quando foi baixado o Ato Institucional número 5, o AI-5, imposto por Costa e Silva em 1968. Dentre outras coisas o AI-5 proibia manifestações políticas, com isso várias formas de artes foram censuradas, inclusive a música, as letras tinha que ser enviadas previamente para o Ministério da Justiça na Divisão de Censura de Divisões Públicas, da Polícia Federal, que faziam uma "análise" para liberar ou não a canção. Muitas eram simplesmente censuradas, sem nenhum argumento plausível.
Dentre as músicas censuradas, algumas são famosas e históricas no cancioneirismo popular brasileiro, como "Alegria, Alegria", de Caetano Veloso, "Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores", de Geraldo Vandré, "Comportamento Geral", Gonzaguinha, "Eu Quero É Botar Meu Bloco Na Rua", Sérgio Sampaio e "Cálice" de Gilberto Gil e Chico Buarque, só para citar algumas. Mas outras como "Mosca Na Sopa", de Raul Seixas, que nitidamente crítica a ditadura, passou pela censura, devido a falta de semântica na análise dos militares, onde Raul é a mosca e a ditadura a sopa, "Se você mata uma, vem outra em meu lugar", na ficha de censura a música foi taxada de mau gosto e estúpida e assim liberada, por considerar que não há uma mensagem em sua composição.
Formulário de censura liberando a música Mosca na Sopa
O AI-5 termina em 1978, a última música censurada no Brasil foi da banda punk Garotos Podres, "Batman", do álbum Pior Que Antes, de 1988, originalmente da banda Submundo, antigo grupo do vocalista Mao em 1981/82. A Polícia Federal proibiu a execução pública, no dia 04 de outubro de 1988 foi julgado o recurso que a gravadora entrou e foi mantida a censura. No dia seguinte, 05 de outubro, entrava em vigor a atual Constituição Federal que extinguiu os órgãos de censura e o veto as músicas.
Música "Batman", da banda Garotos Podres
Porém em 2019, com a chegada de um governo nazifascista ao poder no Brasil a censura retorna, não através de um ato institucional, mas através de várias ações que buscam minar a cultura e a classe artística do país. Uma das mais recente foi o episódio da TV Brasil e o vídeo clipe de "O Real Resiste", de Arnaldo Antunes, que iria ao ar na emissora, mas de repente foi retirado da grade de programação sobe alegação que a produção mostra violência e promove o preconceito, quando na verdade se tem uma letra que fala sobre milicianos, terraplanistas, torturadores e fundamentalistas, além de citar o nome de Marielle Franco, e funcionários da casa afirmaram que o nome da vereadora está proibido de ser vinculado na emissora. Lembrando que a TV Brasil é uma emissora pública que responde ao governo federal.
Video clipe de O Real Resiste, de Arnaldo Antunes
Esse não é uma fato isolado, outra situação aconteceu com BNegão no Festival de Inverno de Bonito (MS), o show foi com a banda Os Seletores de Frequência, interrompido pela PM, que ordenou que o som fosse cortado, depois de Bernardo descer criticas duras ao presidente, a violência policial e os ataques às aldeias Wajapi, no Amapá. Várias pessoas que presenciaram a ação truculenta expersando as pessoas com cacetetes, bombas e gás de pimenta relataram o fato nas redes sociais. O rapper ainda falou em entrevista ao UOL: "estão tentando transformar [o Brasil] em um Estado policial".
O governo fascista de Bolsonaro atuou com censura, através de seus braços políticos, militares e milicianos, não somente na música, como nos exemplos citados, mas também a literatura e o cinema. No audiovisual, cartazes de filmes nacionais foram retirados da sede da Ancine e as informações sobre os mesmos deletadas do site da agência, o filme Marighella, dirigido por Wagner Moura, enfrenta dificuldades (impostas pelo governo, através da Ancine) para estrear nas salas de cinema do país, o filme Chico: Artista Brasileiro, foi censurado em solo uruguaio, durante o Festival de Cinema de Montevidéu, por pressão da embaixada brasileira, e a Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da Republica) que usou suas redes oficiais para criticar a cineasta Petra Costa, que dirigiu do filme Democracia em Vertigem, que aborta o golpe de 2016 e foi indicado ao Oscar 2020, e o fascismo nacional tenta boicotar e difamar a obra e diretora, nessa mesma pegada, tivemos também o caso do canal Porta dos Fundos, que a classe politica e jurídica ligada aos ideais do governo tentou censurar o especial de natal da produtora, tento inclusive sua sede atacada por molotovs, em ação assinada pelos Integralistas, as galinhas verdes também conhecidas como primo pobre do nazismo. E por falar em nazistas, Ricardo Alvim, no auge do seu posto de secretário da cultura, imitou um vídeo de Joseph Goebbels, o idealizador da estética nazi, lá época de Adolf. Alvim caiu, mas vale lembrar que não por ser nazista, mas por não ter sido discreto!
Cartaz do filme Marighella
Na literatura o caso mais recente foi em Rondônia, onde o governo de Marcos Rocha, do PSL, censurou livros de Rubem Alves, Mário de Andrade, Machado de Assis, Franz Kafka e Euclides da Cunha, só para citar alguns de um universo de 43 livros apontados como “inadequados às crianças e adolescentes” e seriam retirados das escolas, mas devido a pressão e a denuncia de censura os canalhas voltaram a atrás. Ainda vale lembrar do episódio da bienal do livro no Rio de Janeiro, com o bispo Crivella, prefeito da cidade, que pediu a retirada do evento da graphic novel Vingadores: A Cruzada das Crianças, cuja a capa mostra duas personagens homoafetivas em um beijo.
um dos quadros da HQ Vingadores: A Cruzada das Crianças
Depois de recapitular esses episódios escrotos, que são apenas a ponta do iceberg, e que aconteceram em pouco mais de um ano desse (des) governo nazifascista a conclusão é para que a classe artística e cultural desse país siga sendo resistência e pressionando contra as tentativas de censura. Músicos, que façam músicas que afrontem e denunciem a autoridade fascista, assim como escritores, colunistas e autores de audiovisual, peço que dediquem parte de sua obra para o combate ao clã da desinformação e culto a estupidez. Seguimos sendo resistência!
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